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Gênese da gestão de riscos: da teoria das probabilidades aos pensadores contemporâneos (parte 1/2)

Gênese da gestão de riscos: da teoria das probabilidades aos pensadores contemporâneos (parte 1/2)

 

1. Introdução

Ao longo dos séculos, a Teoria das Probabilidades tem sido uma pedra angular na tomada de decisões e na compreensão de fenômenos complexos. Desde apostas em jogos até a formulação de estratégias em mercados financeiros, entender e quantificar as probabilidades tornou-se fundamental em inúmeros domínios. Este estudo extenso e detalhado visa iluminar a evolução da Gestão de Riscos, traçando desde os primórdios da Teoria das Probabilidades até sua modernização do pensamento sobre riscos.

Nesta primeira parte do estudo, iremos nos aprofundar na trajetória histórica e transformação da Teoria das Probabilidades, explorando suas origens e o impacto de pioneiros que moldaram seu desenvolvimento. Começaremos delineando o cenário histórico, dando vida à maneira como esta teoria se transformou ao longo do tempo. A seguir, discutiremos sobre os primeiros pensadores da probabilidade, figuras seminais como Pascal, Fermat e Huygens, cujas ideias formaram a base da teoria.

Nos aprofundando ainda mais, iluminaremos as contribuições de cientistas e matemáticos que desempenharam papéis cruciais no desenvolvimento da probabilidade. Dentre eles, exploraremos as obras e insights de luminares como Luca Pacioli, Niccolò de Fontana, até Pierre-Simon Laplace. Cada um desses pensadores, com sua perspectiva única e contribuições inestimáveis, ajudou a moldar a teoria e prática da probabilidade que conhecemos hoje.

É importante notar que este é apenas o começo da nossa jornada. Na segunda parte deste estudo, nos voltaremos para os pensadores contemporâneos e como eles modernizaram a gestão de riscos. Além disso, abordaremos a relevância da teoria das probabilidades no cenário atual e lançaremos um olhar prospectivo sobre o que o futuro reserva para a gestão de riscos.

Com isso, esperamos fornecer uma compreensão abrangente e detalhada da evolução da Gestão de Riscos e sua importância inegável em diversos campos do conhecimento. Convidamos você a nos acompanhar nesta jornada rica e reveladora.

Adicionalmente, é essencial mencionar que este estudo não se restringe somente à teoria e aos conceitos abstratos. Em cada etapa, esforçamo-nos para contextualizar a teoria com exemplos práticos, trazendo-a para o cenário tangível de sua aplicação ao longo do tempo e em nossos dias atuais. Desta maneira, almejamos que a compreensão da probabilidade não permaneça apenas nos domínios matemáticos, mas também se revele em sua aplicação prática no cotidiano das pessoas e organizações. Assim, esta análise oferece não apenas um conhecimento profundo dos princípios da probabilidade, mas também uma visão de como eles têm sido e podem ser efetivamente utilizados para melhorar as decisões e a gestão de riscos na vida real.

 

2. A trajetória histórica e transformação da Teoria das Probabilidades

A matemática sempre buscou modelar e entender fenômenos do mundo real, e com a Teoria das Probabilidades não foi diferente. Como Viali (2008) definiu, ela se destina a lidar com fenômenos não determinísticos onde o 'acaso' é central. Talvez, uma das mais antigas manifestações dessa tentativa de compreensão seja evidenciada nos seguros de comerciantes marítimos mesopotâmicos e fenícios, uma precaução contra os caprichos imprevisíveis do acaso (SILVA, s/d; VIALI, 2008).

Os primeiros passos firmes em direção a um entendimento matemático do acaso foram dados no contexto de jogos de azar. Desde a antiguidade, sociedades como Babilônios, Egípcios, Gregos e Romanos têm evidências de jogos que envolvem chance, como a utilização do astrágalo, um precursor do dado moderno (DAVID, 1962). Esses jogos, além de servirem como entretenimento, eram usados em cerimônias religiosas e adivinhações, sendo vistos como meios de interpretar a vontade dos deuses (COUTINHO, 2007).

Astrálagos / Crédito: Divulgação/ MET - Versão primitiva de nossos dados atuais. Possuem quatro faces diferentes entre si, de forma que podem ser atribuídos valores diferentes para cada lado.

 

A virada quântica na maneira como entendemos a probabilidade começou com os matemáticos da Renascença, como Pacioli, Tartaglia e Cardano, que começaram a estudar as frequências de eventos em jogos de azar (DAVID, 1962). Cardano, por exemplo, começou a usar técnicas de combinatória para calcular a probabilidade de certos eventos, como lançar um dado.

No entanto, o avanço mais significativo aconteceu no século XVII, quando Blaise Pascal e Pierre de Fermat iniciaram uma correspondência sobre um problema apresentado pelo cavaleiro de Méré. Este foi o início real da Teoria das Probabilidades como a conhecemos. Esta troca de ideias entre dois dos maiores matemáticos da época levou ao desenvolvimento dos fundamentos desta nova área da matemática.

A teoria ganhou ainda mais terreno quando grandes nomes como Daniel Bernoulli, Pierre-Simon Laplace e Jakob Bernoulli fizeram contribuições significativas. Daniel Bernoulli, ao abordar o Paradoxo de São Petersburgo, aplicou o cálculo à probabilidade, enquanto Pierre-Simon Laplace desenvolveu a teoria da probabilidade contínua e Jakob Bernoulli descobriu a lei dos grandes números.

A verdadeira beleza da probabilidade reside em sua aplicação prática. Longe de ser uma mera abstração matemática, a probabilidade desempenha um papel crucial em inúmeras decisões do dia a dia. Ela é usada, por exemplo, para calcular riscos em seguros, modelar previsões meteorológicas, estimar a vida útil de equipamentos e muito mais.

A evolução da probabilidade como uma disciplina matemática reflete sua importância no mundo real. Como Dahlke, Fakler e Morash (1981) apontam, a incerteza é uma constante em nossa vida. Portanto, os modelos probabilísticos são uma ferramenta indispensável em nossa busca para entender, prever e gerenciar o acaso em nossas vidas.

Em um mundo cada vez mais incerto, com desafios emergentes, desde catástrofes climáticas até volatilidade de mercado, a Teoria da Probabilidade é fundamental para a gestão moderna de riscos. Ajuda as organizações a prever cenários futuros, alocar recursos de forma eficiente e tomar decisões informadas, maximizando o sucesso e minimizando as perdas.

A Teoria da Probabilidade, que tem suas raízes nos jogos de azar antigos e nas reflexões de matemáticos renascentistas, tornou-se uma ferramenta vital no arsenal de qualquer profissional envolvido em planejamento, tomada de decisão e gestão de riscos. O entendimento do acaso, mais do que um mero jogo de números, é uma necessidade em nosso mundo complexo e incerto.

 

3. Teoria da Probabilidade - primeiros pensadores: Pascal, Fermat e Huygens

O nascimento da teoria da probabilidade no século XVII forneceu as bases para uma das áreas mais fascinantes e fundamentais da matemática. Esta ascensão foi catalisada pela colaboração entre grandes mentes, nomeadamente Blaise Pascal, Pierre de Fermat e, posteriormente, Christian Huygens. A sua interação intelectual, inserida no contexto do Renascimento, revolucionou a maneira como encaramos a incerteza e o acaso.

 

3.1. Blaise Pascal (1623-1662)

Aos 18 anos, Pascal já tinha feito uma marca indelével na ciência, inventando a primeira calculadora mecânica. Ao longo de sua vida, contribuiu com o triângulo aritmético, conhecido por muitos como o Triângulo de Pascal, e também com a lei da física sobre a pressão dos fluidos. No entanto, foi a sua associação com Chevaier de Méré, um filósofo e aristocrata francês, que o conduziu ao campo da probabilidade. De Méré apresentou a Pascal um problema sobre jogos de dados, que acabou levando ao estabelecimento de vários conceitos básicos de probabilidade.

O problema apresentado por Chevalier de Méré a Blaise Pascal é um clássico no campo da probabilidade e foi um catalisador importante para o desenvolvimento da teoria da probabilidade no século XVII. O problema, na verdade, envolve dois jogos de dados distintos, mas vamos nos concentrar no mais famoso deles.

De Méré, um filósofo, escritor e, incidentalmente, um jogador, propôs o seguinte problema a Pascal: Qual é o menor número de lançamentos de dois dados que devem ser feitos para que haja uma chance melhor do que igual (mais de 50%) de obter dois seis em um dado lance pelo menos uma vez?

De Méré já tinha um palpite baseado em sua experiência e cálculos antigos: ele pensava que 24 lançamentos seriam suficientes. No entanto, seus cálculos estavam incorretos.

Vamos entender como Pascal abordou o problema:

1. A probabilidade de obter um seis em um dado é 1/6.

2. A probabilidade de obter dois seis ao lançar dois dados simultaneamente é (1/6) * (1/6) = 1/36.

3. A probabilidade de não obter dois seis em um lançamento de dois dados é 1 - (1/36) = 35/36.

4. Assim, a probabilidade de não obter dois seis em (n) lançamentos consecutivos é (35/36)ⁿ.

5. E a probabilidade de obter pelo menos um duplo seis em (n) lançamentos é 1 - (35/36)ⁿ.

Pascal determinou que, para n=24, a probabilidade de obter pelo menos um duplo seis é de 0,4914 (ou 49,14%), que é menor que 50%. Porém, para n=25, a probabilidade é de 0,5055 (ou 50,55%), que é ligeiramente maior que 50%. Portanto, você precisa de pelo menos 25 lançamentos para ter uma chance melhor do que igual de obter um duplo seis pelo menos uma vez.

A resolução desse problema e a subsequente correspondência entre Pascal e Fermat estabeleceram os alicerces da teoria moderna da probabilidade. Em particular, Pascal usou o que hoje é conhecido como o Triângulo de Pascal (ou Triângulo Aritmético) para resolver problemas mais complexos relacionados a jogos de azar.

 

3.2. Pierre de Fermat (1607-1665)

Fermat, um advogado com paixão pela matemática, foi fundamental para o desenvolvimento da teoria da probabilidade. Além de ser um cofundador desta teoria, Fermat teve impacto no desenvolvimento do cálculo e é considerado o fundador da moderna teoria dos números. Sua correspondência com Pascal em 1654 abordou o problema da divisão em jogos de azar, entre outros problemas matemáticos. A solução proposta por Fermat para o problema da divisão harmonizou com a de Pascal, demonstrando uma colaboração frutífera entre as duas mentes brilhantes.

 

Fermat e Pascal trabalharam juntos no estabelecimento das bases teóricas da teoria da probabilidade

 

3.3. Christian Huygens (1629-1695)

Embora Pascal e Fermat possam ter lançado as bases da teoria da probabilidade, Huygens deu passos significativos para consolidá-la. Além de suas notáveis contribuições à física, Huygens publicou "De Rationcinis in Ludo Aleae" ("Raciocínio sobre jogos de azar") em 1657, o primeiro livro realmente publicado sobre o tema. Seu trabalho expandiu a aplicação da teoria da probabilidade, levando-a da mera análise de jogos para áreas mais amplas, como estatísticas vitais e anuidades.

A colaboração entre Pascal e Fermat, fortalecida pelo trabalho subsequente de Huygens, fez mais do que simplesmente lançar as bases da teoria da probabilidade. Influenciados pelo espírito científico do Renascimento, eles desenvolveram métodos rigorosos e estabeleceram fundamentos teóricos sólidos que até hoje moldam o campo da probabilidade e estatística. De jogos de azar a aplicações em estatísticas vitais, a teoria da probabilidade cresceu e se desenvolveu graças a esses pioneiros do século XVII.

Referências:

  • KoreaScience: A Sketch of the History of Probability Theory.
  • Blaise Pascal: Contribution to the Probability Theory, The Art of Scientific Discovery.
  • Pierre de Fermat: The Mathematical Career of Pierre de Fermat, 1601-1665: Second Edition.
  • Chronology of Probabilists and Statisticians.
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    4. Breves histórias dos principais cientistas e pensadores que contribuíram para o desenvolvimento da probabilidade

     

    4.1. Luca Pacioli (1445 - 1517)

    Luca Pacioli foi um matemático renascentista italiano que é muitas vezes referido como o "Pai da Contabilidade", devido ao seu trabalho seminal no campo da contabilidade. Embora seja mais conhecido por suas contribuições para a contabilidade do que para a probabilidade, sua abordagem à matemática e aos jogos teve um impacto indireto no desenvolvimento da teoria da probabilidade. Contribuições:

  • "Summa de Arithmetica, Geometria, Proportioni et Proportionalità" (1494): Esta é uma das obras mais famosas de Pacioli. Embora seja amplamente reconhecido por seu tratado sobre contabilidade de partidas dobradas neste livro, o "Summa" também discutiu tópicos matemáticos variados, incluindo aritmética, geometria e álgebra. O livro também continha uma seção sobre jogos de azar, onde Pacioli discutia diferentes jogos e os métodos que os jogadores poderiam usar para evitar serem enganados.
  • Discussão sobre Jogos de Dados: Dentro do "Summa", Pacioli descreveu vários jogos populares de sua época que envolviam dados. Embora não desenvolvesse uma teoria formal da probabilidade, suas descrições dos jogos e sua análise de estratégias justas representavam uma abordagem prática dos jogos de azar, o que estabeleceu um precedente para análises mais rigorosas feitas por seus sucessores.
  • Contribuição para a Combinatória: Pacioli também fez contribuições à combinatorics, uma área da matemática estreitamente relacionada à probabilidade. Ele discutiu problemas relacionados a combinações, que mais tarde se tornariam fundamentais para o desenvolvimento da teoria da probabilidade.
  • Legado: Embora Luca Pacioli não tenha desenvolvido uma teoria formal da probabilidade, suas discussões sobre jogos de azar e sua abordagem sistemática à matemática lançaram as bases para os matemáticos do século XVII, como Fermat e Pascal, desenvolverem uma teoria mais robusta. Além disso, a ênfase de Pacioli em aplicar a matemática a problemas práticos do mundo real, como os encontrados nos jogos de azar, ajudou a estabelecer uma tradição de análise aplicada que é fundamental para a teoria da probabilidade moderna.

    Claro! Vamos criar um cenário fictício, baseado nas contribuições de Luca Pacioli, para ilustrar o impacto prático de seu trabalho.

    Nota ao leitor: Ao longo desta exploração histórica, apresentamos casos fictícios para ilustrar a aplicação prática das contribuições desses renomados pensadores. Estes cenários proporcionam uma contextualização de como suas descobertas e inovações poderiam ter sido usadas no cotidiano da época e como, de formas adaptadas, continuam a influenciar nossas práticas atuais. A ideia é sair da teoria pura e visualizar o impacto tangível dessas ideias no dia a dia de pessoas e negócios, tanto no passado quanto no presente.

     

    Veneza antiga - Imagem: BBC News Brasil

     

    Caso exemplo 1: A feira de Veneza e a gestão de riscos

    Contexto: É o ano de 1505, e a Feira de Veneza é um dos maiores eventos comerciais da Europa. Comerciantes de todo o continente vêm para vender e comprar mercadorias, desde especiarias até tecidos preciosos. Neste cenário, os riscos de negócios, como perdas, roubos e preços flutuantes, são uma grande preocupação.

    Problema: Lorenzo, um rico comerciante de Veneza, tem uma grande quantidade de seda para vender na feira. No entanto, ele está preocupado com a variabilidade dos preços, a concorrência e a possibilidade de roubo. Ele busca aconselhamento sobre como minimizar seus riscos.

    Solução: Um colega de Lorenzo recomenda que ele consulte o famoso matemático, Luca Pacioli, que recentemente publicou um livro chamado "Summa de Arithmetica".

    Ao se encontrarem, Pacioli aconselha Lorenzo da seguinte maneira:

  • Contabilidade Rigorosa: Pacioli recomenda que Lorenzo mantenha um registro meticuloso de todas as transações usando o método de partidas dobradas. Isso ajudará Lorenzo a ter uma visão clara de seus lucros e perdas, permitindo que ele tome decisões mais informadas.
  • Diversificação de Riscos: Usando conceitos de combinatorics, Pacioli sugere que Lorenzo não venda toda a sua seda em um único dia ou a um único comprador. Em vez disso, ele deve diversificar, vendendo em diferentes dias e para diferentes compradores. Isso reduziria o risco de uma grande perda em um dia de baixa demanda ou devido a um único comprador inadimplente.
  • Estratégias de Preço: Baseando-se na seção de jogos de azar de seu livro, Pacioli aconselha Lorenzo a adotar uma estratégia de precificação variável. Assim como um jogador pode ajustar suas apostas com base no jogo, Lorenzo pode ajustar seus preços com base nas condições do mercado.
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    Resultado: Seguindo os conselhos de Pacioli, Lorenzo consegue vender sua seda com lucro, minimizando perdas. Ele se torna um defensor da contabilidade rigorosa e das estratégias de diversificação de riscos, influenciando outros comerciantes de Veneza a adotarem práticas semelhantes.

    Aplicação nos dias atuais: O legado de Pacioli pode ser visto hoje em práticas de contabilidade padrão e na gestão de riscos. Empresas modernas diversificam seus investimentos, mantêm registros contábeis rigorosos e usam dados para tomar decisões informadas, refletindo as abordagens que Pacioli defendia. Além disso, o método de partidas dobradas é ainda o fundamento da contabilidade moderna.

     

    4.2. Niccolò de Fontana (1500 - 1557)

    Também conhecido como Tartaglia, Niccolò de Fontana foi um matemático italiano renomado por suas contribuições em diversas áreas da matemática, incluindo a solução para as equações cúbicas. Seu apelido, Tartaglia, que significa "gago" em italiano, foi adotado após ele ter sido ferido durante invasões francesas em sua cidade natal, Brescia, o que lhe deixou com uma fala comprometida.

    A contribuição de Tartaglia para a teoria das probabilidades não foi tão direta quanto a de outros matemáticos da época. No entanto, seu trabalho em álgebra e particularmente com equações cúbicas criou alicerces matemáticos que seriam essenciais para os desenvolvimentos futuros na área de probabilidade. É uma lembrança da interconexão entre diferentes campos da matemática e de como avanços em uma área podem impulsionar descobertas em outra.

    Além de suas contribuições matemáticas, Tartaglia também se envolveu em intensas disputas acadêmicas com outros matemáticos, como Gerolamo Cardano, com quem teve um desacordo sobre a solução das equações cúbicas.

     

    Caso exemplo 2: Otimização de lucros

    Imaginemos um comerciante de Veneza no século XVI tentando otimizar seus lucros. Ele frequentemente enfrenta uma série de decisões comerciais complexas: quais rotas de comércio são as mais lucrativas, qual a quantidade ideal de mercadorias a ser comprada, quais riscos estão associados a cada transação, etc.

    Com a abordagem matemática de Tartaglia, esse comerciante teria uma ferramenta adicional ao lidar com questões de otimização. Por exemplo, ao modelar seus lucros e perdas como funções (talvez usando equações cúbicas), ele poderia prever mais precisamente os resultados de diferentes estratégias comerciais. Embora a teoria das probabilidades como a conhecemos hoje ainda não estivesse completamente formada, o tipo de pensamento algébrico que Tartaglia promoveu proporcionou uma estrutura para abordar questões de incerteza e risco.

    No mundo moderno, as ideias básicas de Tartaglia continuam relevantes, principalmente na área financeira. Hoje, os bancos e as instituições financeiras usam modelos matemáticos complexos (que têm suas raízes nos trabalhos de matemáticos como Tartaglia) para avaliar riscos e tomar decisões informadas.

     

    4.3. Galileu Galilei (1564 – 1642)

    Galileu Galilei, um dos luminares da história da ciência, é frequentemente celebrado por suas revolucionárias descobertas astronômicas e pela invenção do telescópio. No entanto, sua influência se estendeu para além da astronomia e da física, alcançando também o domínio emergente da probabilidade.

    Ele seguiu os passos de Cardano ao contribuir para o desenvolvimento da probabilidade. Embora seja mais amplamente reconhecido por seus trabalhos em física, especialmente relacionados à queda de corpos, Galileu também dedicou tempo ao estudo dos jogos de azar. Seu tratado, intitulado "Sopra le Scoperta dei Dadi" (Reflexões sobre jogos de dados), publicado pela primeira vez em Florença em 1718, desvenda várias questões estatísticas. Uma demonstração notável de seu trabalho neste livro é a solução que ele propôs para o problema de determinar o número de resultados possíveis ao lançar três dados. Esta solução não apenas foi a mais completa de sua época, mas também pôde ser generalizada para considerar um número maior de dados.

    Mas o legado de Galileu na probabilidade não se limitou apenas a jogos. Ele estabeleceu fundamentos teóricos no campo da estatística. Maistrov, em sua análise do trabalho de Galileu, observa que ele compreendeu que os erros de medição são inevitáveis e que estes erros se distribuem de forma simétrica. Galileu também percebeu que a probabilidade de um erro ocorrer aumenta conforme a magnitude do erro diminui e que a maioria das observações tende a se agrupar em torno de um valor central ou verdadeiro. Suas reflexões sobre os erros nas observações e a forma como eles se manifestam nos cálculos subsequentes anteciparam características da futura lei de distribuição de probabilidade normal, uma das fundamentações mais importantes na estatística moderna.

     

    As Grandes Navegações - Fonte: Toda Matéria

     

    Caso exemplo 3: A gestão de riscos na navegação

    Contexto: No início do século XVII, o aperfeiçoamento das técnicas de navegação era crucial para as grandes potências marítimas da época. A precisão das medições era vital para a segurança e sucesso das viagens transatlânticas.

    Problema: Navegadores e capitães enfrentavam um grande dilema: como garantir uma viagem segura quando as medições e observações astronômicas tinham erros inevitáveis? A menor discrepância nas observações poderia resultar em rotas erradas, levando a navios naufragados ou perdidos.

    Solução: Inspirados pelo trabalho de Galileu sobre erros de medição e sua distribuição, alguns matemáticos e navegadores da época começaram a aplicar os conceitos de probabilidade e distribuição simétrica nas suas observações. Ao reconhecer que a maioria das observações se agrupava em torno de um valor verdadeiro, eles poderiam calcular uma média ponderada das observações, minimizando assim os efeitos dos erros aleatórios.

    Resultado: Com a aplicação desses conceitos, as rotas de navegação tornaram-se mais precisas e seguras, levando a menos naufrágios e mais sucesso nas viagens comerciais. A aceitação da existência de erros e a aplicação de técnicas estatísticas para gerenciá-los transformaram a navegação e o comércio marítimo da época.

    Aplicação nos dias atuais: O legado de Galileu continua a influenciar nossa abordagem moderna para gestão de riscos em vários campos, especialmente na era digital. Por exemplo, no mundo das finanças, os erros de previsão e análise são inevitáveis, assim como Galileu observou em suas medições. Hoje, algoritmos sofisticados usam distribuições de probabilidade, semelhantes à normal, para prever e gerenciar riscos em portfólios de investimento, garantindo melhores retornos e minimizando perdas potenciais.

     

    4.4. René Descartes (1596-1650)

    René Descartes (1596-1650), filósofo, cientista e matemático francês é considerado com Francis Bacon, um dos fundadores da Filosofia moderna.

    O pensamento cartesiano de René Descartes, com sua ênfase na razão, na lógica e na análise sistemática, teve uma influência significativa no desenvolvimento de várias disciplinas, incluindo a gestão de riscos dos dias atuais. Embora Descartes não tenha abordado explicitamente a gestão de riscos em sua filosofia, os princípios fundamentais do pensamento cartesiano podem ser aplicados no campo da gestão de riscos.

    A abordagem cartesiana enfatiza a importância da análise racional e da separação de problemas complexos em partes menores e mais gerenciáveis. Essa abordagem analítica pode ser aplicada na identificação, análise, avaliação e mitigação de riscos. Ao dividir os riscos em componentes individuais mais simples, é possível examinar e entender melhor cada elemento e suas interações, permitindo uma tomada de decisão mais informada.

    Além disso, a busca de certeza e a redução da incerteza são preocupações centrais no pensamento cartesiano. Na gestão de riscos, busca-se minimizar a incerteza e maximizar a previsibilidade por meio de técnicas como análise de dados, modelagem estatística e simulações. Essas abordagens buscam fornecer informações e insights sobre os riscos potenciais e suas probabilidades associadas.

     

    René Descartes: Os princípios do pensamento cartesiano podem ser aplicados no campo da gestão de riscos.

     

    O pensamento cartesiano também enfatiza a importância do raciocínio dedutivo, da análise lógica e da tomada de decisões baseada em evidências. Esses princípios são aplicáveis na gestão de riscos ao considerar a coleta e análise de dados relevantes, a avaliação de diferentes opções e estratégias de mitigação e a tomada de decisões informadas com base nas informações disponíveis.

    Além disso, a ênfase de Descartes na clareza e distinção de ideias pode ser aplicada na comunicação e na compreensão dos riscos. A gestão de riscos envolve a comunicação eficaz dos riscos identificados e de suas implicações para as partes interessadas, facilitando uma compreensão clara e mútua sobre os riscos envolvidos.

    Em resumo, embora o pensamento cartesiano não tenha sido diretamente aplicado à gestão de riscos, os princípios fundamentais, como análise sistemática, busca de certeza, raciocínio lógico e comunicação clara, têm influência e colaboração indiretas na abordagem contemporânea da gestão de riscos.

    Para apoiar o desenvolvimento de projetos de gestão de riscos, a obra mais recomendada de René Descartes é "Discurso do Método", disponível para download no e-Disciplina da USP clicando aqui. Publicado em 1637, esse livro é uma das principais obras filosóficas de Descartes e estabelece as bases para o pensamento cartesiano. A obra aborda a necessidade de duvidar de preconceitos e crenças preconcebidas, enfatizando a importância de uma abordagem racional e crítica. Isso pode ser aplicado na gestão de riscos, incentivando uma avaliação objetiva dos riscos, questionando suposições e considerando diferentes perspectivas antes de tomar decisões.

    Embora o "Discurso do Método" não seja um livro diretamente voltado para a gestão de riscos, ele fornece uma base filosófica sólida para o pensamento analítico e lógico, que são aspectos essenciais na gestão de riscos. É uma leitura recomendada para aqueles interessados em compreender os princípios subjacentes ao pensamento cartesiano e como eles podem ser aplicados em diferentes campos, incluindo a gestão de riscos.

     

    Caso exemplo 4: Aplicação do pensamento cartesiano na gestão de riscos de uma Companhia Marítima do Século XVII

    Contexto: No século XVII, o comércio marítimo estava em seu auge, com navios cruzando os mares carregando mercadorias valiosas de um continente a outro. No entanto, essas jornadas não estavam isentas de riscos: tempestades, pirataria e erros de navegação eram ameaças constantes.

    Problema: Uma companhia marítima em particular enfrentava perdas crescentes devido a naufrágios e ataques piratas. A necessidade de uma gestão de riscos eficaz era evidente. No entanto, os problemas eram complexos e multifacetados. A liderança da companhia percebeu que abordagens tradicionais, baseadas em superstições e intuições, não eram mais suficientes.

    Solução: Inspirando-se no "Discurso do Método" de René Descartes, um jovem conselheiro da companhia propôs uma abordagem cartesiana à gestão de riscos. O primeiro passo foi dividir o complexo problema dos riscos marítimos em partes menores e mais gerenciáveis. Cada risco, seja ele devido a fenômenos naturais, erro humano ou ameaças externas, foi analisado isoladamente.

    A coleta e análise de dados sobre cada incidente permitiram a identificação de padrões. Por exemplo, observou-se que certas rotas eram mais propensas a ataques piratas, enquanto outras estavam mais expostas a tempestades. A análise lógica e dedutiva, alinhada ao pensamento cartesiano, foi aplicada para avaliar a interação entre esses riscos individuais.

    Resultado: Com essa abordagem, a companhia pôde desenvolver estratégias específicas para cada tipo de risco. Rotas foram alteradas, melhores práticas de navegação foram implementadas e acordos foram feitos com nações locais para proteção contra piratas. Em poucos anos, a taxa de incidentes da companhia caiu drasticamente.

    Aplicação nos dias atuais: O método cartesiano de análise e solução de problemas tem vasta aplicação no mundo atual, especialmente na gestão de riscos. Empresas, grandes ou pequenas, frequentemente enfrentam incertezas e riscos multifacetados. Ao adotar uma abordagem que decompõe problemas complexos em partes menores e analisa cada elemento de forma lógica e sistemática, as empresas estão melhor equipadas para entender, avaliar e mitigar riscos. Seja na gestão financeira, operações de manufatura, ou planejamento estratégico, o legado cartesiano ressoa claramente, enfatizando a importância da razão, clareza e análise lógica.

     

    4.5. Girolamo Cardano (1501 - 1576)

    O matemático, médico e jogador italiano Gerolamo Cardano, muitas vezes referido em outras línguas como Jerome Cardan, foi um pioneiro em várias disciplinas e uma figura indiscutivelmente excêntrica durante o Renascimento. Seu legado para a ciência da probabilidade é notavelmente consolidado em seu livro "Liber de Ludo Aleae" (Livro sobre Jogos de Azar), escrito em 1526. Embora a obra só tenha sido publicada postumamente em 1663, dentro de uma coletânea de seus trabalhos, ela é reconhecida como o primeiro livro dedicado ao estudo da probabilidade.

    Cardano, além de ser conhecido por sua erudição, também ganhou notoriedade por sua vida turbulenta. Ele era notavelmente um jogador ávido, o que frequentemente o levava a dificuldades financeiras. Dentre suas excentricidades, conta-se que previu a data de sua própria morte e, em um esforço para tornar sua previsão realidade, teria jejuado por três semanas. Sua integridade também foi questionada em alguns momentos, sendo acusado, por exemplo, de plagiar o trabalho do matemático Tartaglia sobre a resolução de equações cúbicas.

    Apesar das controvérsias em torno de sua pessoa, o "Liber de Ludo Aleae" trouxe contribuições iniciais significativas para a teoria da probabilidade. Cardano introduziu a ideia de "circuito", um precursor do que hoje conhecemos como espaço amostral. Por meio desse conceito, ele abordou a noção de calcular a probabilidade de um evento, usando o exemplo de lançar dois dados e determinando a chance de as faces somarem 10. Embora ele não tenha usado a linguagem moderna de "probabilidade", seus métodos insinuavam claramente essa ideia, identificando probabilidades como frações de seu "circuito".

    Apesar de ser o pioneiro na discussão da teoria das probabilidades, alguns historiadores não o veem como o fundador absoluto desta ciência. Suas abordagens, embora avançadas para sua época, ainda não eram completamente matematizadas, faltando regras rigorosas para solucionar os problemas que ele propunha. Contudo, ao examinar a amplitude e profundidade dos tópicos que ele abordou, é inegável que Cardano estava muito à frente de seu tempo. Comparativamente, embora o trabalho de Galileu em probabilidade fosse menos extenso que o de Cardano, sua capacidade de pensar e escrever de forma científica era superior.

    Em síntese, Girolamo Cardano, apesar de suas peculiaridades pessoais, lançou uma base sólida para o estudo da probabilidade, moldando o caminho para futuros pensadores e matemáticos nesta área.

     

    Jogos de azar eram populares entre nobre e burgueses do Período Renascentista. Foto: Pixabay

     

    Caso exemplo 5: Girolamo Cardano e a gestão de riscos em jogos de azar

    Contexto: No auge do Renascimento italiano, os jogos de azar eram uma distração popular entre a nobreza e a burguesia. Jogadores frequentemente apostavam grandes somas de dinheiro, buscando estratégias que pudessem aumentar suas chances de vitória. Foi neste ambiente que Girolamo Cardano, um matemático, médico e, curiosamente, jogador assíduo, começou a analisar o jogo de uma perspectiva mais sistemática.

    Problema: Cardano, apesar de seu gosto pelos jogos, enfrentava frequentes problemas financeiros. Ele percebeu que muitos jogadores, incluindo ele mesmo, frequentemente baseavam suas apostas em suposições ou superstições, sem uma compreensão real das chances envolvidas. A falta de uma abordagem sistemática e analítica para entender e calcular as probabilidades em jogos de azar levou muitos a falências inesperadas.

    Solução: Dedicando-se ao estudo matemático dos jogos de azar, Cardano escreveu "Liber de Ludo Aleae". Nesta obra, ele introduziu a noção de "circuito", uma ideia precursora do espaço amostral moderno. Usando o exemplo de lançar dois dados, ele calculou as possibilidades de somas específicas, como 10, e determinou suas chances relativas. Esse método analítico, embora rudimentar para os padrões modernos, representou um dos primeiros esforços para quantificar e entender riscos em um ambiente de jogo.

    Resultado: Apesar de seu livro só ter sido publicado postumamente, as ideias de Cardano se espalharam entre círculos de jogadores e matemáticos. Com um entendimento mais claro das probabilidades, os jogadores puderam tomar decisões mais informadas sobre suas apostas, reduzindo perdas e maximizando ganhos. Esta abordagem analítica, embora inicialmente focada em jogos, preparou o terreno para desenvolvimentos mais avançados na teoria da probabilidade.

    Aplicação nos dias atuais: Hoje, o legado de Cardano é sentido não apenas nos cassinos, mas em quase todos os setores que lidam com incertezas e riscos. Empresas de finanças usam técnicas avançadas de probabilidade para avaliar riscos de investimentos. O setor de seguros usa conceitos similares para calcular prêmios e reservas. Mesmo em áreas como a inteligência artificial e aprendizado de máquina, a compreensão das probabilidades é fundamental. A abordagem de Cardano, que começou como uma tentativa de entender os jogos de azar, acabou por influenciar a maneira como gerenciamos e entendemos riscos em nossa sociedade moderna.

    Referências:

  • KoreaScience: A Sketch of the History of Probability Theory.
  • X Seminário Nacional de História da Matemática: Um passeio histórico pelo início da Teoria das Probabilidades
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    4.6. Pierre de Fermat (1601 - 1665)

    Como já falamos de Pierre de Fermat no inicio do estudo, seremos breves nessa sessão. Advogado de profissão e matemático por vocação, é amplamente reconhecido por seus significativos avanços em várias áreas da matemática, particularmente a teoria dos números. Embora sua correspondência com Blaise Pascal seja frequentemente citada como o nascimento da teoria das probabilidades, o trabalho de Fermat expande muito além disso.

    Contribuições:

  • Teoria das Probabilidades: Fermat, em sua troca de cartas com Pascal, discutiu problemas relacionados a jogos de azar, lançando as bases para a teoria das probabilidades. Eles não apenas resolveram o problema dos pontos - sobre como dividir as apostas em um jogo de azar quando é interrompido prematuramente - mas também introduziram conceitos fundamentais que formariam a espinha dorsal da teoria moderna das probabilidades.
  • Teoria dos Números: Fermat é mais conhecido por sua "Última Teorema", uma conjectura que ele propôs, mas cuja prova completa só foi apresentada por Andrew Wiles em 1994. O teorema postula que não existem três inteiros positivos a, b e c que satisfaçam a equação aⁿ+bⁿ=cⁿ para qualquer valor inteiro de n maior que 2.
  • Geometria Analítica: Fermat, trabalhando paralelamente a Descartes, fez contribuições essenciais para a geometria analítica. Ele desenvolveu um método para encontrar os máximos e mínimos de polinômios, um precursor do cálculo.
  • Óptica: Ele é responsável pelo "Princípio de Fermat", que afirma que a luz sempre toma o caminho que requer o menor tempo ao se mover de um ponto a outro.
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    Dado o vasto leque de suas contribuições, é impressionante considerar que Fermat nunca publicou um trabalho matemático durante sua vida. Muitas de suas descobertas foram postumamente compartilhadas através de cartas a amigos e colegas, solidificando seu legado como um dos grandes matemáticos do século XVII.

     

    4.7. Blaise Pascal (1623 - 1662)

    Como também já falamos de Blaise Pascal no inicio do estudo, seremos breves nessa sessão. Nascido em Clermont-Ferrand, França, foi um matemático, físico, inventor, filósofo e teólogo renomado. Apesar de sua curta vida, deixou uma marca indelével na história do pensamento científico.

    Pascal foi um prodígio. Aos 16 anos, ele já havia escrito um tratado sobre os senos projetados, uma área de estudo na geometria. No entanto, sua contribuição mais notável para a probabilidade ocorreu durante uma série de correspondências com Pierre de Fermat em 1654. Juntos, eles lançaram as bases da teoria da probabilidade ao resolver o "Problema dos Pontos", um dilema relacionado a determinar o vencedor de um jogo de apostas interrompido.

    Essa correspondência entre Fermat e Pascal é vista por muitos como o início formal da teoria matemática da probabilidade. Pascal também explorou a noção de "valor esperado", que é a média ponderada de todos os resultados possíveis de uma situação aleatória, crucial para a tomada de decisões em situações incertas.

    Em seu "Tratado do triângulo aritmético" de 1654, Pascal, juntamente com Pierre de Fermat, estabeleceu as bases da teoria das probabilidades e da análise combinatória. Esta base foi desenvolvida posteriormente por Huygens.

    Além de seus trabalhos em matemática e probabilidade, Pascal é conhecido pelo desenvolvimento da "Calculadora Pascalina", uma das primeiras máquinas de calcular mecânicas, e pelo estudo da pressão dos fluidos, levando ao que é agora conhecido como o "Princípio de Pascal" na hidrodinâmica.

    Embora muitas de suas descobertas sejam tecnicamente complexas, a essência do legado de Pascal está em sua abordagem inovadora para resolver problemas e sua habilidade inigualável de interconectar diferentes campos do saber. A teoria das probabilidades de Pascal e as descobertas que se seguiram revolucionaram a maneira como as decisões são tomadas em áreas que envolvem incerteza e risco, como na economia e, em particular, na ciência atuarial.

     

    Pintura feita no ano 1881 por William Aiken Walker - Tuscaloosa Museum of Art (United States)

     

    Caso exemplo 6: Gestão de riscos em plantios agrícolas

    Contexto: Durante o século XVII na França, muitos agricultores enfrentavam períodos alternados de fartura e escassez, influenciados por variações climáticas e outras incertezas. O setor agrícola da época não contava com ferramentas ou metodologias avançadas para prever ou gerenciar essas flutuações, tornando os agricultores vulneráveis a safras ruins.

    Problema: Um agricultor chamado Jean tem várias terras em cultivo e está tentando decidir quanto plantar no próximo ano. O investimento em sementes, mão de obra e outros recursos é alto. Se ele plantar muito e uma geada inesperada atingir, ele terá enormes perdas. Por outro lado, se ele plantar pouco, corre o risco de perder uma grande colheita em caso de condições ideais.

    Solução: Inspirado pelos trabalhos de Blaise Pascal sobre teoria das probabilidades e jogos de azar, Jean decide aplicar um método primitivo de análise de riscos. Ele revisa os registros das safras passadas, analisa os padrões de clima e utiliza a probabilidade para estimar os resultados potenciais de diferentes cenários de plantio.

    Aplicando os princípios da Teoria das Probabilidades, ele cria um "jogo" simples, onde cada escolha de plantio representa uma "aposta", e o retorno esperado é calculado com base nas probabilidades de diferentes resultados climáticos.

    Resultado: Com esta abordagem, Jean não apenas se protege das piores perdas, como também otimiza seu plantio para maximizar os lucros em média ao longo de vários anos. Seu método atrai a atenção de outros agricultores, que começam a adotar técnicas semelhantes, levando a uma revolução na gestão de riscos na agricultura da época.

    Aplicação nos dias atuais: Nos tempos modernos, a gestão de riscos é uma parte essencial de quase todos os setores. No mundo agrícola, tecnologias avançadas, como a Agricultura de Precisão, utilizam vastos conjuntos de dados e algoritmos sofisticados para prever e gerenciar riscos. No entanto, o núcleo dessas práticas, a ideia de avaliar probabilidades e tomar decisões informadas, pode ser rastreado até os princípios estabelecidos por Pascal. Empresas de seguro agrícola, por exemplo, usam modelos matemáticos e probabilísticos para determinar preços de apólices e coberturas, uma extensão direta da lógica pascaliana aplicada por Jean em seu plantio.

     

    4.8. James Bernoulli (1654-1705)

    James Bernoulli, também conhecido como Jakob Bernoulli, membro proeminente da renomada família matemática dos Bernoulli, começou sua jornada acadêmica na teologia antes de encontrar sua verdadeira paixão na matemática. Além de seus talentos matemáticos, ele possuía um interesse acentuado pela astronomia. Conhecido em toda a Europa, Bernoulli foi aclamado como um professor excepcional de matemática, sendo seus ensinamentos requisitados por estudantes de várias partes do mundo.

    A influência seminal para Bernoulli no campo da probabilidade foi o livro de Huygens, "Reasoning on Games of Chance". Entretanto, seu trabalho mais emblemático foi "Ars Conjectandi" (Arte de Conjecturar), publicado postumamente em 1713. Esta obra não apenas reforçou seu legado como matemático pioneiro mas também pavimentou o caminho para a teoria moderna das probabilidades.

    A profundidade e abrangência do "Ars Conjectandi" são notáveis:

  • Primeira parte: Reimprime o livro de Huygens, acrescentando comentários perspicazes de Bernoulli.
  • Segunda parte: Dedica-se a uma exploração completa da teoria combinatória da época, introduzindo novas propriedades combinatórias derivadas por ele.
  • Terceira parte: Concentra-se em soluções meticulosas para 24 problemas relacionados a jogos de azar.
  • Quarta parte: Embora incompleta, essa seção é fundamental, pois aborda as aplicações da probabilidade a problemas civis, morais e econômicos. Esta parte sinaliza o início de uma nova era na história da probabilidade.
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    James Bernoulli acreditava firmemente na utilidade da probabilidade, não apenas como uma ferramenta matemática, mas também como uma forma de entender e navegar pelo mundo incerto. Ele enfatizava a aplicação prática da probabilidade e acreditava que ela poderia ser usada para tomar decisões mais informadas em uma variedade de campos.

    Entre suas inúmeras contribuições, o teorema do limite de Bernoulli, frequentemente referido como a lei fraca dos grandes números, é de destaque singular. Com este teorema, as aplicações práticas da teoria das probabilidades expandiram-se exponencialmente. A importância deste teorema não pode ser subestimada, pois não apenas ampliou o escopo da probabilidade, mas também abriu caminho para subsequentes teoremas limites.

     

    Caso exemplo 7: O Teorema de Bernoulli e o nascimento dos seguros de vida

    Contexto: Durante o século XVII, enquanto a teoria das probabilidades estava ganhando terreno, a vida nas cidades europeias estava cheia de incertezas. Doenças, acidentes e outras fatalidades eram comuns, levando famílias inteiras à ruína devido à perda súbita de um provedor.

    Problema: Em uma sociedade sem sistemas de bem-estar social robustos, a morte inesperada de um membro que trouxesse renda à família poderia deixá-la em extrema pobreza. As pessoas estavam em busca de maneiras de garantir algum tipo de segurança financeira em tais eventos trágicos.

    Solução: Utilizando os conceitos da Lei dos Grandes Números, proposta no teorema de Bernoulli, alguns empresários e matemáticos viram uma oportunidade. Eles começaram a coletar dados sobre expectativa de vida, causas de morte e outros padrões. Com base nestes dados e na teoria de Bernoulli, foram capazes de calcular probabilidades e criar um dos primeiros modelos de seguro de vida. Indivíduos pagariam uma quantia regular, e, em caso de morte, suas famílias receberiam uma quantia predeterminada.

    Resultado: Esses seguros ganharam popularidade rapidamente, pois proporcionavam uma rede de segurança financeira. Não apenas ofereciam paz de espírito para as famílias, mas também se tornaram um negócio lucrativo, uma vez que as empresas de seguros poderiam prever com relativa precisão quantas apólices teriam que pagar a cada ano.

    Aplicação nos dias atuais: A indústria de seguros de vida é agora uma gigante global, avaliada em trilhões de dólares. Enquanto a ciência e a tecnologia avançaram, permitindo cálculos mais precisos e a criação de produtos de seguro mais diversificados, os fundamentos ainda se baseiam na teoria das probabilidades. O legado de Bernoulli pode ser visto a cada vez que alguém assina uma apólice de seguro, protegendo seu futuro financeiro e o bem-estar de sua família.

     

    4.9. Abraham de Moire (1667-1754)

    Abraham de Moivre foi um matemático francês, famoso por seus trabalhos na teoria da probabilidade e estatística. Nascido em Vitry-le-François, França, ele foi educado em teologia, mas seu interesse verdadeiro sempre esteve nas matemáticas.

    Ele mudou-se para a Inglaterra em 1688, fugindo da perseguição aos protestantes na França após a revogação do Édito de Nantes. Na Inglaterra, ele desenvolveu um relacionamento próximo com muitos matemáticos proeminentes da época, incluindo Isaac Newton e Edmond Halley.

    Sua maior contribuição à teoria das probabilidades foi o seu livro "The Doctrine of Chances", publicado pela primeira vez em 1718. Esta obra influente introduziu muitos conceitos que se tornaram fundamentais para o campo e foi um dos primeiros tratados a tratar de probabilidade como uma disciplina matemática em si.

    O mais notável de suas contribuições foi a formulação do que agora é conhecido como a "Fórmula de De Moivre", que conecta a trigonometria e os números complexos. Além disso, seu trabalho em distribuições normais e teoremas de limite foram cruciais para o desenvolvimento subsequente da estatística e probabilidade. Ele também investigou a distribuição binomial e o que mais tarde seria conhecido como o teorema central do limite.

    De Moivre também se interessou pelas aplicações práticas de seus trabalhos, principalmente em jogos de azar e anuidades. Ele foi um dos primeiros a abordar problemas de vida e morte usando probabilidades, estabelecendo assim as bases para os futuros sistemas de seguros de vida.

    Em resumo, a vida e obra de Abraham de Moivre representam uma etapa crucial na transformação da probabilidade de meros jogos de azar e conjecturas em uma disciplina matemática rigorosa e aplicada. Seu legado ainda é sentido hoje, à medida que seus princípios fundamentais continuam a informar e influenciar as modernas teorias de probabilidade e estatística.

     

    Revista de seguros agosto de 1945 by CNseg - Issuu

     

    Caso exemplo 8: A evolução dos seguros de vida

    Contexto: No início do século XVIII, a ideia de seguros de vida estava ganhando terreno na Europa. As pessoas estavam cada vez mais interessadas em garantir a estabilidade financeira de suas famílias após sua morte. No entanto, a falta de um modelo matemático robusto tornava difícil para as companhias de seguro determinar prêmios adequados e garantir sua própria sustentabilidade.

    Problema: As companhias de seguro precisavam de um método para prever, com precisão, a expectativa de vida de um indivíduo, considerando várias variáveis. Estabelecer prêmios muito altos afastaria os clientes, enquanto prêmios muito baixos poderiam levar a empresa à falência.

    Solução: Abraham de Moivre, utilizando seus conhecimentos em probabilidade, começou a abordar o problema de vida e morte de um ponto de vista probabilístico. Ele desenvolveu um modelo que permitiu às seguradoras estimar com mais precisão a expectativa de vida de um indivíduo. Usando a distribuição binomial e o que mais tarde seria conhecido como o teorema central do limite, ele forneceu uma abordagem para entender a variabilidade inerente à expectativa de vida.

    Resultado: Com base nos estudos de De Moivre, as seguradoras puderam criar planos de seguro de vida mais refinados e justos, garantindo não apenas a proteção financeira das famílias dos segurados, mas também a viabilidade econômica da própria indústria de seguros.

    Aplicação nos Dias Atuais: O trabalho de De Moivre foi fundamental para estabelecer os alicerces dos modernos sistemas de seguros de vida. Hoje, com o auxílio de tecnologias avançadas e análise de big data, as seguradoras refinaram ainda mais seus modelos. No entanto, os princípios fundamentais de usar probabilidade para avaliar riscos, estabelecidos por pensadores como De Moivre, ainda estão no coração da indústria de seguros e em muitos outros campos que lidam com incertezas e riscos.

     

    4.10. Pierre-Remond de Montmort (1678-1719)

    Pierre-Remond de Montmort foi um matemático francês conhecido por suas contribuições significativas para a teoria da probabilidade no início do século XVIII. Nascido em Paris, ele foi inicialmente atraído por temas filosóficos e literários, mas mais tarde desenvolveu um profundo interesse pela matemática.

    De Montmort é mais famosamente conhecido pelo seu livro "Essay d'Analyse sur les Jeux de Hazard" (Ensaio de Análise sobre Jogos de Azar), publicado pela primeira vez em 1708. Este trabalho foi fundamental porque foi um dos primeiros a tratar da probabilidade relacionada a jogos de cartas e jogos de azar, algo que era muito popular na época e serviu como uma excelente aplicação prática da teoria da probabilidade.

    Seu problema mais famoso, agora conhecido como o "Problema de Montmort" ou "Problema de Encontro", diz respeito a um jogo de cartas onde um baralho de cartas é embaralhado e, em seguida, revelado uma por uma, verificando-se se a primeira carta é um ás, a segunda um dois e assim por diante. De Montmort desenvolveu uma solução usando a combinação de séries e permutações.

    Ele também manteve correspondência com outros matemáticos famosos da época, como Johann Bernoulli, contribuindo para a evolução da teoria da probabilidade como uma disciplina.

    De Montmort não apenas explorou jogos de azar por curiosidade matemática, mas também porque eles forneceram problemas concretos que permitiam a aplicação da teoria da probabilidade emergente. Seu trabalho foi uma ponte entre a teoria pura e sua aplicação prática.

     

    Caso exemplo 9: A estratégia de Montmort no mundo dos negócios

    Contexto: No início do século XVIII, os jogos de azar eram populares e muitos tentavam desenvolver estratégias para maximizar seus ganhos. Dada a popularidade dos jogos de cartas, muitos nobres gastavam quantias significativas neles, o que representava uma forma concreta de risco financeiro.

    Problema: Um nobre francês, o Conde de Léger, apaixonado por jogos, notou que suas perdas financeiras estavam aumentando com o tempo, pois não possuía nenhuma estratégia consistente. Ele ouviu falar do trabalho de Montmort sobre a probabilidade em jogos de cartas e decidiu procurá-lo para ajudar a desenvolver uma estratégia de jogo mais informada.

    Solução: Montmort analisou o jogo favorito do Conde, similar ao seu famoso "Problema de Encontro", e calculou as probabilidades de certos eventos ocorrerem. Ele não apenas ofereceu ao Conde uma estratégia de jogo com base em probabilidade, mas também o instruiu sobre quando parar de jogar e quando aumentar sua aposta, com base nas probabilidades em jogo.

    Resultado: Armado com esta nova estratégia, o Conde de Léger viu uma melhoria significativa em seus resultados de jogo, não apenas reduzindo suas perdas, mas também, em muitos casos, saindo com lucro. A reputação de Montmort cresceu, e ele se tornou um conselheiro valioso para muitos outros nobres em questões de jogos de azar.

    Aplicação nos dias atuais: O conceito por trás do "Problema de Encontro" de Montmort e sua aplicação prática na estratégia de jogo do Conde se reflete nos modernos algoritmos de otimização usados em finanças e investimentos. Fundos de hedge e bancos de investimento frequentemente usam técnicas similares, derivadas dos princípios da probabilidade, para otimizar suas estratégias de negociação no mercado de ações. A ideia de calcular riscos, avaliar probabilidades e ajustar estratégias em conformidade é agora fundamental na gestão de ativos e investimentos. O legado de Montmort vive através desses modernos algoritmos de otimização, que se esforçam para maximizar retornos enquanto minimizam riscos.

     

    4.11. Thomas Bayes (1701-1761)

    Thomas Bayes foi um matemático e ministro presbiteriano inglês que é mais conhecido por ter formulado o teorema que leva seu nome, o Teorema de Bayes. Embora ele nunca tenha publicado essa formulação em sua vida, seu trabalho foi descoberto e postumamente publicado por outro matemático, Richard Price.

    A grande realização de Bayes foi estabelecer os fundamentos da inferência bayesiana, uma abordagem estatística que permite atualizar as probabilidades à medida que mais informações se tornam disponíveis. Em vez de trabalhar com uma única estimativa fixa, a inferência bayesiana atualiza probabilidades com base em novas evidências.

    A contribuição central de Bayes foi entender que poderíamos começar com uma estimativa inicial, ou uma "probabilidade a priori", e depois atualizá-la usando novas evidências para obter uma "probabilidade a posteriori". Esta abordagem tem uma ampla gama de aplicações, desde a interpretação de resultados de testes médicos até a tomada de decisões em incertezas nos negócios ou em finanças.

    A originalidade e utilidade do Teorema de Bayes só foi verdadeiramente reconhecida no século 20, muito depois de sua morte. Seu trabalho forneceu a base para a moderna estatística bayesiana, que é fundamental em muitos campos da ciência, engenharia, medicina e finanças.

    O teorema de Bayes é considerado uma das pedras angulares da teoria da probabilidade e tem desempenhado um papel significativo na revolução das ciências de dados e aprendizado de máquina no século 21. A perspicácia de Bayes em compreender a natureza iterativa e atualizável da probabilidade marcou uma mudança significativa na forma como entendemos e utilizamos a estatística.

     

    A identidade de "Jack, o Estripador", que matou pelo menos seis mulheres no bairro londrino de Whitechapel em

     

    Caso exemplo 10: O Teorema de Bayes e segurança física

    Contexto: Durante o século 19, em uma cidade movimentada na Europa, as autoridades estavam preocupadas com uma série de roubos que vinham ocorrendo. Para identificar e capturar os criminosos, eles decidiram desenvolver um sistema de segurança baseado em relatos de testemunhas oculares. No entanto, nem todos os relatos eram precisos, levando frequentemente a detenções de inocentes.

    Problema: A confiabilidade dos relatos de testemunhas era variável. Algumas testemunhas eram extremamente confiáveis, enquanto outras frequentemente se confundiam. A polícia precisava de uma maneira de ponderar os relatos com base em sua probabilidade de serem verdadeiros para minimizar as detenções errôneas.

    Solução: A abordagem bayesiana foi adotada. Inicialmente, uma probabilidade a priori foi atribuída à culpabilidade de um suspeito com base em evidências iniciais, como estar próximo ao local do crime. Quando um relato de testemunha ocular era recebido, essa probabilidade era atualizada. Para testemunhas com um histórico comprovado de relatos precisos, a probabilidade a posteriori da culpabilidade do suspeito aumentava significativamente. Por outro lado, para testemunhas com históricos menos confiáveis, a atualização era mínima.

    Resultado: Com a abordagem bayesiana, as autoridades conseguiram uma detenção mais precisa dos criminosos, reduzindo a probabilidade de prender inocentes. O sistema também incentivou as testemunhas a serem mais precisas em seus relatos, sabendo que sua confiabilidade seria registrada e usada em futuras ocorrências.

    Aplicação nos dias atuais: Hoje, o princípio bayesiano é frequentemente usado em sistemas de segurança avançados, especialmente em reconhecimento facial. Quando uma câmera de segurança capta um rosto, um software compara essa imagem com um banco de dados. A correspondência inicial, ou probabilidade a priori, pode sugerir um possível match. No entanto, à medida que mais características são comparadas (olhos, nariz, boca, etc.), a probabilidade é constantemente atualizada, refinando a precisão da identificação. Assim, a abordagem de Bayes continua a proteger pessoas e propriedades na era moderna, garantindo que as decisões sejam tomadas com o maior grau de certeza possível.

     

    4.12. Leonard Euler (1707-1783)

    Leonhard Euler, um matemático e físico suíço renomado, é reconhecido por seus vastos trabalhos em diversos campos da matemática. Sua carreira foi marcada por mais de 500 publicações, abrangendo temas como cálculo, teoria dos números, geometria e, claro, probabilidade.

    Euler não apenas estabeleceu marcos em várias áreas da matemática, mas também foi instrumental no avanço da teoria da probabilidade, especialmente no contexto de gestão de riscos.

  • Loterias para o tesouro do governo: O rei Frederico da Prússia solicitou a Euler que concebesse uma loteria para reabastecer os cofres do governo. Nos anos que se seguiram, o rei consultou Euler várias vezes sobre loterias. Diante deste desafio, Euler analisou meticulosamente as probabilidades de se obterem sequências específicas de números. Usando esses cálculos, ele pôde determinar o preço ideal de venda de um bilhete de loteria, garantindo que a loteria fosse justa e também lucrativa para o tesouro.
  • Jogos de azar: Euler também investigou jogos de azar, incluindo jogos de cartas. Ele abordou uma série de problemas associados a esses jogos, calculando a probabilidade de diferentes resultados, o que é fundamental na concepção de jogos justos.
  • Demografia e seguros: As contribuições de Euler também se estenderam ao campo da demografia e dos seguros. Suas técnicas pioneiras na demografia formaram a base para os estudos modernos da população. Seu método sistemático de abordar problemas começava com um caso simples, progredia para situações mais complexas e culminava na resolução do caso geral.
  • Aplicações práticas: O principal impacto de Euler na probabilidade reside nas aplicações práticas. Enquanto matemático de renome, ele se encontrou frequentemente diante de desafios práticos com nuances probabilísticas. Esses desafios não apenas foram abordados com engenho, mas também deram origem a ferramentas teóricas e soluções para uma ampla gama de problemas.
  • Por fim, embora a obra de Euler em probabilidade possa parecer menor em comparação com suas outras realizações, ela exemplifica as forças motrizes por trás do crescimento da teoria da probabilidade, particularmente quando aplicada à gestão de riscos.

     

    Caso exemplo 11: A loteria de Frederico e a avaliação moderna de riscos

    Contexto: No século XVIII, os cofres do governo prussiano, sob o reinado de Frederico, enfrentavam desafios financeiros. Era necessário encontrar maneiras inovadoras de gerar receita sem sobrecarregar ainda mais os cidadãos com impostos.

    Problema: A ideia de estabelecer uma loteria pública foi proposta como uma maneira de arrecadar fundos. No entanto, configurar uma loteria justa, na qual os cidadãos se sentissem inclinados a participar, ao mesmo tempo garantindo um lucro substancial para os cofres do governo, era um desafio.

    Solução: Leonhard Euler foi chamado para ajudar a criar esta loteria. Usando sua proficiência em probabilidade, ele foi capaz de calcular as chances de diferentes sequências de números serem sorteadas. Estes cálculos foram vitais para determinar o preço dos bilhetes, os prêmios oferecidos e a proporção de lucro que o governo poderia esperar. Ao equilibrar a atratividade da loteria para os participantes com os interesses financeiros do governo, Euler garantiu que a iniciativa fosse bem-sucedida.

    Resultado: A loteria foi um sucesso retumbante. Não só aumentou significativamente a receita para os cofres do governo, como também se tornou um modelo para outras loterias estatais na Europa. Além disso, o equilíbrio entre atratividade e lucratividade se tornou um padrão na concepção de jogos e loterias similares.

    Aplicação nos dias atuais: O legado de Euler não se restringe à sua época. Hoje, as empresas modernas, especialmente as do setor financeiro, usam técnicas semelhantes para avaliar riscos e recompensas. Fundos de investimento e seguradoras, por exemplo, analisam probabilidade e retorno potencial para determinar a viabilidade e atratividade de diferentes investimentos ou políticas. O método de Euler de equilibrar probabilidade e potencial de retorno tornou-se uma ferramenta essencial na avaliação e gestão de riscos em diversas indústrias modernas.

     

    Referência:

  • KoreaScience: A Sketch of the History of Probability Theory.
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    4.13. Thomas Simpson (1710-1761)

    Thomas Simpson foi um matemático e inventor britânico que deixou uma marca indelével no campo da probabilidade e estatística. Sua jornada na matemática foi notável, especialmente considerando que ele começou a trabalhar como tecelão e, posteriormente, autodidata, mergulhou profundamente nos estudos matemáticos.

    Sua obra mais renomada é o "Treatise on the Nature and Properties of Logarithms", mas seu impacto na probabilidade foi particularmente notável em "Doctrine of Annuities and Reversions" e em "Doctrine of Chances". No "Doctrine of Annuities and Reversions", Simpson abordou problemas relacionados a finanças, particularmente no cálculo de anuidades, algo essencial para a emergente indústria de seguros da época. No "Doctrine of Chances", ele se aprofundou nas teorias probabilísticas, expandindo e refutando alguns dos trabalhos anteriores de De Moivre.

    Além disso, Simpson foi um pioneiro na aplicação da teoria da probabilidade à tomada de decisões práticas e à indução estatística. Ele entendeu que a probabilidade não se tratava apenas de jogos de azar, mas tinha aplicações práticas significativas, como na demografia e na economia.

    Seu trabalho em estatística, particularmente o método de Simpson para a interpolação, ainda é relevante e utilizado nos dias de hoje. Seus estudos sobre a distribuição de probabilidades e o uso de médias também lançaram as bases para muitos procedimentos estatísticos modernos.

    Simpson também foi um fervoroso defensor da aplicação da probabilidade em julgamentos jurídicos, reconhecendo que as decisões poderiam ser mais justas se informadas por uma avaliação objetiva e probabilística dos fatos, em vez de apenas depender do testemunho subjetivo.

    Em resumo, Thomas Simpson foi uma figura crucial na transição da probabilidade de um tópico de curiosidade matemática para uma ferramenta prática usada em finanças, direito, demografia e outras áreas. Seus métodos e ideias continuam a influenciar a maneira como pensamos sobre risco, recompensa e tomada de decisão até hoje.

     

    Pintura de 1683 de Francisco Rizi retratando um auto de fé na

     

    Caso exemplo 12: A avaliação probabilística no julgamento de crimes

    Contexto: Durante o século XVIII, a Inglaterra vivenciava um aumento no número de casos jurídicos, fruto do crescimento urbano e das transformações socioeconômicas da época. A natureza subjetiva de muitos julgamentos frequentemente resultava em vereditos contestáveis.

    Problema: Em um caso específico, um mercador foi acusado de fraude por supostamente ter vendido tecidos abaixo do padrão prometido. O testemunho baseou-se em depoimentos de clientes insatisfeitos e uma única análise manual da qualidade do tecido. No entanto, a falta de uma avaliação objetiva e a possibilidade de viés nas testemunhas apresentavam um risco real de um julgamento injusto.

    Solução: Inspirados pelos trabalhos de Thomas Simpson sobre a aplicação da probabilidade em julgamentos, os advogados de defesa propuseram uma avaliação probabilística. Eles coletaram amostras de tecidos vendidos pelo mercador e conduziram testes independentes para determinar sua qualidade. Através das técnicas de Simpson, puderam calcular a probabilidade de que os tecidos vendidos fossem consistentemente abaixo do padrão prometido.

    Resultado: A avaliação mostrou que, embora algumas amostras estivessem ligeiramente abaixo do padrão, a grande maioria estava dentro da qualidade prometida. A probabilidade de que o mercador estivesse vendendo intencionalmente tecidos defeituosos era, portanto, baixa. Com esta análise objetiva, os juízes decidiram absolver o mercador, evitando um possível erro judiciário baseado em testemunhos subjetivos.

    Aplicação nos dias atuais: Hoje, a estatística e a probabilidade são partes fundamentais dos processos jurídicos em todo o mundo, especialmente em casos de responsabilidade civil e criminal. Seja através da análise de padrões em dados de crimes ou da avaliação da probabilidade de certos eventos ocorrerem, os princípios estabelecidos por matemáticos como Simpson continuam a garantir que a justiça seja feita de forma mais precisa e imparcial. Em muitos sistemas jurídicos modernos, evidências baseadas em análises estatísticas e probabilísticas são consideradas cruciais, especialmente em casos que envolvem padrões de comportamento ou a probabilidade de certos eventos.

     

    4.14. Pierre-Simon Laplace (1749-1827)

    Pierre-Simon Laplace, também conhecido como Marquês de Laplace, renomado matemático, físico e astrônomo francês, moldou o curso da ciência com contribuições monumentais em diversos campos, especialmente na teoria da probabilidade. Conhecido muitas vezes como o pai da probabilidade moderna, ele não só construiu sobre os alicerces estabelecidos por seus predecessores, mas também introduziu conceitos novos e revolucionários. Suas principais contribuições para a probabilidade:

  • Regra de Bayes: Apesar de Thomas Bayes ter sido o pioneiro deste teorema, foi Laplace quem refinou e popularizou esta regra, expandindo sua aplicabilidade em várias esferas da ciência. Ele percebeu o potencial do teorema de Bayes em inferência estatística, permitindo atualizações de probabilidades à medida que novas evidências são obtidas.
  • Distribuição de Probabilidade: Enquanto muitos pensadores da época trabalhavam com probabilidades discretas, Laplace introduziu a noção de que a probabilidade poderia ser representada como uma distribuição contínua. Isso estabeleceu as bases para a teoria estatística moderna e permitiu avanços em áreas como a estatística inferencial.
  • Método dos Mínimos Quadrados: Laplace também contribuiu para o desenvolvimento do método dos mínimos quadrados, uma técnica fundamental usada em estatística para otimizar modelos e fazer previsões. Este método é crucial em regressão e outros modelos estatísticos.
  • Causalidade e Determinismo: No aspecto filosófico, a visão determinista de Laplace é notória. Ele postulou que, se uma entidade (frequentemente referida como o "Demônio de Laplace") pudesse conhecer a posição e velocidade de todas as partículas no universo em um determinado momento, essa entidade poderia prever com precisão todos os eventos futuros. Embora esta seja uma perspectiva filosófica e não estritamente matemática, reflete a profunda confiança de Laplace na capacidade da ciência de descrever e prever o mundo.
  • Teoria das Probabilidades: Em "Théorie Analytique des Probabilités", publicada em 1812, Laplace solidificou e expandiu o domínio da probabilidade. Ele reuniu resultados prévios, melhorou os métodos de prova, estabeleceu bases para o estudo de várias regularidades estatísticas e aplicou com sucesso a teoria da probabilidade à estimativa de erros na observação.
  • Regra de Sucessão: Esta é uma das contribuições mais notáveis de Laplace. A regra aborda a probabilidade de um evento ocorrer, com base em observações anteriores, e é especialmente útil quando se tem uma pequena amostra.
  • Teorema do Limite: Laplace é frequentemente reconhecido pelo teorema do limite, que estuda a distribuição dos desvios da frequência de ocorrência de um evento numa sequência de tentativas independentes. Seu trabalho mostrou que esta distribuição se aproxima da distribuição normal de probabilidade.
  • Definição Clássica de Probabilidade: Embora Laplace não tenha sido o criador original desta definição, ele a popularizou. Esta definição baseia-se no conceito de equipossibilidade: se os resultados de uma experiência são equiprováveis, a probabilidade de um evento é dada pelo número de resultados favoráveis ao evento dividido pelo número total de resultados.
  • Aplicação em Demografia: Laplace tinha um interesse especial na aplicação da probabilidade na demografia, especificamente na condução de censos por amostragem. Isso solidificou ainda mais a ponte entre probabilidade e estatística.
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    Laplace era ambicioso em sua visão, acreditando que a teoria da probabilidade poderia ser aplicada a muitos campos, até mesmo a problemas sociais complexos. O legado de Laplace na teoria da probabilidade é vasto e multifacetado. Seu trabalho continua a influenciar a ciência moderna, com muitos de seus conceitos e teorias ainda ensinados e aplicados em diversos campos hoje. Seu entusiasmo e confiança na teoria da probabilidade também destacam a importância e o potencial desta disciplina, mesmo que algumas de suas aplicações tenham sido vistas com ceticismo.

    Caso exemplo 13: Laplace e a gestão de epidemias

    Contexto: No início do século XIX, Paris estava enfrentando surtos recorrentes de doenças infecciosas. Com a crescente urbanização e o consequente aumento da densidade populacional, a gestão e o controle dessas epidemias tornaram-se cruciais.

    Problema: O governo francês estava incerto sobre como alocar recursos eficientemente para prevenir e controlar a propagação de tais doenças. Faltavam dados e métodos sistemáticos para prever a progressão das epidemias e identificar as áreas mais afetadas.

    Solução:

  • Laplace, reconhecido por suas habilidades em matemática e probabilidade, foi consultado. Ele utilizou o conceito da distribuição de probabilidade para modelar a propagação da doença, considerando variáveis como densidade populacional, interações sociais e taxas de infecção.
  • Usando a Regra de Bayes, ele atualizou continuamente suas previsões à medida que novos dados sobre os casos de infecção eram relatados. Isso permitiu uma visão dinâmica e adaptável da progressão da doença.
  • Além disso, Laplace empregou o Método dos Mínimos Quadrados para otimizar o modelo, minimizando os erros entre suas previsões e os casos reais observados, refinando ainda mais suas previsões.
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    Resultado: Com a ajuda dos modelos estatísticos de Laplace, o governo francês foi capaz de prever com maior precisão áreas potencialmente mais afetadas e alocar recursos médicos e sanitários de forma mais eficaz. A capacidade de antecipar surtos permitiu intervenções rápidas, salvando muitas vidas e reduzindo o impacto geral das epidemias na sociedade parisiense da época.

    Aplicação nos dias atuais: O legado de Laplace vive até hoje. Suas técnicas de modelagem probabilística são usadas em epidemiologia moderna para prever e gerenciar surtos de doenças, incluindo pandemias globais como a COVID-19. Organizações de saúde e governos ao redor do mundo usam variações dos métodos de Laplace para informar políticas públicas, alocar recursos e desenvolver estratégias de vacinação.

    A aplicação moderna da Regra de Bayes, por exemplo, permite a incorporação contínua de novos dados para refinar previsões e modelos, tornando-a uma ferramenta valiosa na gestão de riscos em saúde pública e em muitos outros campos.

    Este exemplo demonstra como as contribuições teóricas de pensadores como Laplace podem ter implicações práticas profundas, não apenas em seu próprio tempo, mas também séculos depois.

     

    5. Conclusão da primeira parte do estudo

    Ao explorar a fascinante jornada da Teoria das Probabilidades, somos transportados através de uma trajetória histórica repleta de descobertas e transformações. Desde as suas origens, esta teoria foi moldada e refinada por mentes brilhantes que contribuíram com seus insights e pesquisas pioneiras. Inicialmente, tivemos a contribuição dos primeiros pensadores, como Pascal, Fermat e Huygens, que lançaram as bases para o entendimento moderno das probabilidades. Suas ideias iniciais desencadearam uma série de descobertas por vários outros estudiosos.

    Luca Pacioli, considerado o pai da contabilidade, e Niccolò de Fontana, com seus estudos pioneiros em matemática, pavimentaram o caminho para pensadores subsequentes. Galileu Galilei e René Descartes, por exemplo, integraram a probabilidade em suas reflexões científicas. Girolamo Cardano, com sua obra "Liber de Ludo Aleae", trouxe à tona a importância da probabilidade no jogo. Ao longo dos anos, figuras como James Bernoulli, Abraham de Moire, e Pierre-Remond de Montmort enriqueceram o campo com suas contribuições únicas. O teorema de Bayes, proposto por Thomas Bayes, e os estudos de Leonard Euler e Thomas Simpson, adicionaram novas dimensões à teoria. Finalmente, a consolidação de diversos conceitos por Pierre-Simon Laplace proporcionou um alicerce sólido para a teoria das probabilidades, como a conhecemos hoje.

    Ao longo desta primeira parte do estudo, não nos limitamos apenas a abordar os fundamentos teóricos e os grandes pensadores que moldaram a Teoria das Probabilidades. Em cada etapa, foram apresentados exemplos práticos que elucidaram a real aplicabilidade das ideias discutidas. Estes exemplos serviram para traçar a ligação entre teoria e prática, destacando como as descobertas em matemática e probabilidade foram fundamentais para a compreensão e resolução de problemas cotidianos.

    Desde os jogos de azar analisados por Cardano até as questões de partilha justa de Pascal e Fermat, vimos como a Teoria das Probabilidades foi consistentemente utilizada para abordar dilemas reais da época. Estes exemplos primitivos, por mais simples que possam parecer à primeira vista, estabeleceram as bases para o desenvolvimento dos conceitos mais avançados e sofisticados que vieram a seguir.

    É importante reconhecer que, ao contextualizar estas ideias no dia a dia das pessoas daquelas eras, conseguimos perceber que a Teoria das Probabilidades não era uma mera abstração matemática, mas uma ferramenta vital para tomar decisões mais informadas e avaliar riscos de forma eficaz. Esta evolução histórica, juntamente com os exemplos práticos, demonstra como os fundamentos estabelecidos ao longo dos séculos foram cruciais para a formação dos conceitos modernos de gestão de riscos. Hoje, graças a essas bases sólidas, as organizações e indivíduos estão equipados com ferramentas mais robustas e métodos refinados para navegar em um mundo repleto de incertezas e complexidades.

    Tendo mergulhado profundamente nas raízes históricas e nos desenvolvimentos primordiais desta ciência fascinante, estamos agora preparados para avançar para a próxima fase de nosso estudo. Na segunda parte, nos voltaremos para os pensadores contemporâneos que trouxeram uma modernização significativa à gestão de riscos. Analisaremos as obras e impactos de personalidades como Bill Gore, Andrey Kolmogorov, Daniel Kahneman, Amos Tversky, entre outros, e compreenderemos as inovações e desafios contemporâneos neste campo. Além disso, destacaremos a importância contínua da teoria das probabilidades e lançaremos luz sobre as perspectivas futuras para a gestão de riscos. Fique atento à publicação da segunda parte deste estudo nos próximos dias!